OS
AVANÇOS, MUDANÇAS E DESAFIOS TRAZIDOS PELA NOVA
LEI DE MIGRAÇÃO BRASILEIRA (LEI Nº
13.445/17)
A Lei de Migração (Lei nº 13.445/17) significou um
grande avanço legislativo na temática das migrações internacionais, já que
revogou o defasado Estatuto do Estrangeiro (Lei nº 6.815/80) e adequou o texto
da legislação migratória brasileira ao conteúdo da Constituição Federal de
1988, a qual orienta-se por princípios essenciais para a salvaguarda dos
direitos humanos e equipara brasileiros e estrangeiros no exercício e garantia
de grande parte dos direitos fundamentais.
Tal adequação
se mostrava extremamente necessária e urgente já que o Estatuto do Estrangeiro,
promulgado durante o regime da ditadura militar, não colocava o migrante como
ponto central da legislação. Nesse período, havia no Brasil uma preocupação
excessiva com a questão da proteção à segurança nacional, ao interesse nacional
e ao trabalhador brasileiro. Tais prioridades eram evidenciadas logo no início
da superada legislação, em seu artigo 2º. Sendo assim, o Estatuto do
Estrangeiro assumiu um caráter excludente e, por conseguinte, afetou
negativamente a vida de muitos migrantes internacionais que viviam no Brasil
durante a sua vigência, que se prolongou por quase quarenta anos.
O Projeto de
Lei nº 2.516/15 foi o responsável por originar a Lei de Migração, e um aspecto
importante a ser destacado sobre o texto daquele refere-se ao fato de que, ao
longo de sua tramitação, foram realizadas audiências públicas e ouvidos
diversos atores, como: migrantes, pesquisadores, instituições que trabalham com
a temática migratória etc. Tais debates foram de extrema importância para a
elaboração da atual legislação migratória, enriquecendo o texto da lei e
adequando-o à salvaguarda dos direitos humanos. Sob a perspectiva desse
projeto, que foi aprovado pelo Senado brasileiro no dia 18 de abril de 2017, o
ponto central da legislação migratória seria o migrante, o que representou um
avanço enorme diante do Estatuto do Estrangeiro. No dia 24 de maio de 2017, a
nova legislação migratória foi sancionada pelo presidente da república, com
vinte vetos. Por fim, a mesma entrou em vigor no dia 21 de novembro de 2017.
Importantes
vetos que merecem ser citados referem-se aos dispositivos que versavam sobre a
concessão de uma nova anistia (Artigo 118), a garantia do direito à livre
circulação dos povos indígenas e das populações tradicionais em terras
tradicionalmente ocupadas (Artigo 1º, §2º), o acesso dos serviços públicos de
saúde por parte dos visitantes (Artigo 4º, §4º) e concessão de visto ou
autorização de residência para fins de reunião familiar, com base em vínculo
social (Artigo 37, Parágrafo único).
Mesmo com os
vetos supramencionados, a Lei de Migração trouxe mudanças importantíssimas para
a política migratória brasileira. Merece destaque a própria nomenclatura da
lei, pois a palavra “estrangeiro” provém da palavra francesa
"étranger", cuja origem é étrange
(estrange até o século XII), por
sua vez do latim extranĕus (estranho, de fora). Ou seja, o migrante deixa de
ser tratado como um estranho, como alguém que não pertence ao território
brasileiro. Destarte, o antigo RNE (Registro Nacional do Estrangeiro) deixa de
existir, dando lugar ao RNM (Registro Nacional Migratório), conforme reza o
artigo 117 da lei em voga.
É fácil perceber que há uma quebra de
paradigma, já que o Estatuto do Estrangeiro deixava o migrante, como sujeito de
direitos, em segundo plano. A nova legislação migratória trouxe consigo uma
mudança de foco, abandonando a preocupação excessiva com a segurança pública
nacional e passando a priorizar o migrante. Tal fato é evidenciado pelo artigo
3º da Lei de Migração, que estabelece os princípios e diretrizes da política
migratória brasileira. Vale também frisar que o artigo 4º equipara brasileiros
e estrangeiros no exercício e garantia de grande parte dos direitos
fundamentais.
Alguns pontos
que merecem destaque referem-se ao fato de a nova legislação alcançar também os
brasileiros que se estabelecem no exterior (Artigo 1º, §1º, II) e os apátridas
(Artigo 1, §1º, VI). A questão da acolhida humanitária (Artigo 3º, VI), do
repúdio e prevenção à xenofobia, ao racismo e a quaisquer formas de
discriminação (Artigo 3º, II), da não criminalização da migração (Artigo 3º,
III), da garantia ao direito de reunião familiar (Artigo 3º, VIII) e da
migração e desenvolvimento humano no local de origem, como direitos
inalienáveis de todas as pessoas (Artigo 3º, XX), também são dignos de realce.
No que tange
aos brasileiros vivendo no exterior, o artigo 77 dita as políticas e diretrizes
a serem observadas pelas políticas públicas voltadas aos emigrantes, visando
proteger e facilitar a vida dessas pessoas. Por sua vez, o artigo 78 estabelece
que, em situações de ameaça à paz social e à ordem pública por grave ou
iminente instabilidade institucional ou de calamidade de grande proporção na
natureza, deverá ser prestada especial assistência ao emigrante pelas
representações brasileiras no exterior.
O
estabelecimento de mais canais de regularização migratória também foi um grande
avanço proporcionado pela Lei de Migração, a qual estabelece a promoção de
entrada regular e de regularização documental como um dos princípios e
diretrizes a nortear a política migratória brasileira (artigo 3º, V). É
necessário pontuar que, apesar de a nova lei basear-se na não criminalização da
migração (artigo 3º, III), ela traz consigo o artigo 115, que tipifica como
crime a promoção de migração ilegal, acrescentando assim o artigo 232-A ao
Código Penal Brasileiro.
Quanto à acolhida
humanitária, é necessário dizer que antes da Lei de Migração, o Brasil
utilizava-se de resoluções normativas para conceder vistos por razões
humanitárias. Sendo assim, a inclusão da acolhida humanitária como parte dos
princípios e diretrizes que passam a reger a política migratória brasileira
(artigo 3º, VI) constitui outro importante avanço trazido pela Lei de Migração.
Por sua vez, o artigo 14 afirma que o visto temporário para acolhida
humanitária poderá ser concedido ao apátrida ou ao nacional de qualquer país em
situação de grave ou iminente instabilidade institucional, de conflito armado,
de calamidade de grande proporção, de desastre ambiental ou de grave violação
de direitos humanos ou de direito internacional humanitário, ou em outras
hipóteses, na forma de regulamento.
O artigo 4º da
Lei 13.445/17 apresenta um amplo rol com os diversos direitos assegurados aos
migrantes, entre eles: direito à reunião familiar do migrante com seu cônjuge
ou companheiro e seus filhos, familiares e dependentes; direito de reunião para
fins pacíficos; direito de associação, inclusive sindical, para fins lícitos;
amplo acesso à justiça e à assistência jurídica integral gratuita aos que
comprovarem insuficiência de recursos; direito à educação pública, vedada a discriminação
em razão da nacionalidade e da condição migratória; isenção das taxas de que
trata esta Lei, mediante declaração de hipossuficiência econômica, na forma de
regulamento e direito a abertura de conta bancária.
No que tange à
isenção das taxas supramencionadas (artigo 4º, XII), a garantia de tal direito
pela legislação migratória impactou positivamente a vida de diversos migrantes
em situação de hipossuficiência econômica. Não raras eram as ocasiões em que a
regularização dos migrantes encontrava entraves nos altos custos relacionados à
mesma.
Os avanços
trazidos pela Lei de Migração são inegáveis, transparecendo sua pretensão de
alterar a realidade existente no país, no que diz respeito à política
migratória brasileira. Já o Decreto nº 9.099/17, responsável por regulamentar a
nova legislação migratória brasileira, infelizmente não manteve o teor desta
última, fragilizando as intenções almejadas por esta. Tal fato evidencia a
necessidade de educar a sociedade brasileira quanto ao fenômeno migratório
internacional e aos direitos dos migrantes, pois apesar do progresso trazido
pela nova Lei de Migração, o Estatuto do Estrangeiro e seus resquícios ainda
continuam bastante vivos no pensamento de muitas pessoas, inclusive de
indivíduos responsáveis por decretos regulamentares. Sendo assim, a construção
de um novo olhar social quanto à migração internacional apresenta-se como um
dos grandes desafios a serem enfrentados pela nova legislação migratória
brasileira.
Taynara Arimatéa Neves, Advogada
Colaboradora
do Law Offices of Witer DeSiqueira
OBS.:
O propósito deste artigo é informar as pessoas sobre imigração americana,
jamais deverá ser considerado uma consultoria jurídica, cada caso tem suas
nuances e maneiras diferentes de resolução. Esta matéria poderá ser considerada
um anúncio pelas regras de conduta profissional do Estado da Califórnia e Nova
York. Portanto, ao leitor é livre a decisão de consultar com um advogado local
de imigração.
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